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EXCELENTISSIMO
SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA COMARCA DE TATUI/SP.
Processo n. 359/2009
“A imprensa é a
vista da Nação. Por
ela é que a Nação acompanha
o que lhe passa ao perto
e ao longe, enxerga o que lhe
malfazem, devassa o que
lhe ocultam e tramam, colhe o que
lhe sonegam, ou roubam, percebe
onde lhe alvejam, ou nodoam, mede o que
lhe cerceiam, ou destroem,
vela pelo que lhe interessa,
e se acautela do que a ameaça”.
Ruy Barbosa
“(...) nada mais nocivo,
nada mais perigoso do que a
pretensão do Estado
de regular a liberdade de expressão,
pois o pensamento
há de ser livre
– permanentemente livre,
essencialmente
livre, sempre livre.”
Ministro Celso de Mello
INTEGRAÇÃO – O JORNAL DO POVO LTDA.,
empresa jornalística, e JOSÉ REINER FERNANDES, vem, por seu
advogado, C O N T E S T A R a
Ação de Indenização por Danos Morais proposta por HENRIQUE AUTRAN
DOURADO, expondo e requerendo o seguinte:
Alega o
autor, na inicial, que “O
jornalista José Reiner Fernandes, pelo Jornal Integração de Tatuí, do qual é o
responsável, e através de seu blog vinculado ao referido periódico, vem,
continuadamente, agredindo e perseguindo o Autor, com publicações para
macular-lhe a honra e a imagem”.
Reclama, outrossim, que “A maneira de jornalismo praticada pelos Réus, s.m.j.,
fere a Constituição Federal, as disciplinas do Código de Ética dos Jornalistas
Brasileiros, o Decreto n. 83.284/79 e a Lei 5.250 de 9 de fevereiro de 1967”. E que tais publicações, por infundadas, vem
conturbando a vida social e profissional do Autor, além da sua própria rotina
na direção do Conservatório.
Em seguida (ítens 1 a 6), transcreve textos do periódico e do
blog referidos, os quais, no seu disparatado entendimento, teriam maculado a sua honra e a sua imagem.
Item 1: “55 anos de tradição.
Conservatório de Tatuí, com seus 55 anos de tradição, É ADMINISTRADO POR TATUIANOS, goza de grande prestígio internacional.” O destaque, conforme nô-lo diz o próprio
Autor, não é do jornal. Item 2: “MUDANÇA NA DIREÇÃO DO CONSERVATÓRIO? Nos meios
políticos de Tatuí, especula-se que o atual diretor administrativo do
Conservatório, Henrique Autran Dourado, deverá ser substituído na direção da
escola de música. Os rumores, com reflexão especulativa, informam que a decisão
irrecorrível deverá acontecer na volta do prefeito Luiz Gonzaga Vieira de
Camargo, atualmente gozando um curto período de férias, após sua posse do novo
mandato. Segundo consta, o nome do indicado também circula na voz popular.
Seria – especula-se – uma pessoa que se identifica com a administração
municipal e atende os interesses para que se mantenha o Conservatório, orgulho
dos tatuianos, como uma das principais escolas de música do País”. Item 3: “NOTA DA REDAÇÃO – A carta
acima publicada não reflete a opinião deste jornal. A Secretaria da Cultura
pode estar satisfeita com a direção do Conservatório, mas o povo de Tatuí,
temos certeza que não. Ainda
esclarecemos aos nossos leitores que, neste momento, existem dois
procedimentos em andamento no Ministério Público do Estado de São Paulo, que
envolvem a atual administração da Associação dos Amigos do Conservatório de
Tatuí. A este órgão fiscalizador da Justiça compete promover o inquérito civil
e a ação civil pública para a defesa do patrimônio público e social, bem como
da probidade e legalidade administrativas, quando a responsabilidade for
decorrente de ato praticado, em razão de suas funções, por secretário de Estado e membros da diretoria
ou do conselho de administração de entidades da administração indireta do
Estado. Portanto, do Ministério Público a atual diretoria do Conservatório não
escapa. A AACT não vai poder ignorar os
questionamentos administrativos feitos a ela. Vai ter que dar todas as
satisfações e informações requisitadas, tanto sobre um processo seletivo
denunciado ao MP, quanto a um procedimento encaminhado pelo promotor Alexandre
Magalhães ao Procurador Fernando Grella Vieira, da Procuradoria de Justiça do
Estado de São Paulo, versando sobre as circunstâncias em que foi nomeado o
atual diretor do Conservatório. Por derradeiro, não podemos deixar de louvar os
dotes clarividentes do secretário adjunto Ronaldo Bianchi. Em um comunicado publicado no site da
Secretaria da Cultura pelo Centro Tom Jobim em 11 de novembro de 2008, ele
consegue a façanha de “desmentir” uma matéria que só seria publicada pelo jornal
O Estado de S. Paulo no dia
30 de dezembro de 2.008.” Item 4: “CONSTITUIÇÃO FEDERAL
PROTEGE PROFESSORES DO
CONSERVATÓRIO. Muitos professores do Conservatório, que se inscreveram no
processo seletivo aberto pela atual administração da escola de ensino musical,
podem estar protegidos pela Constituição Federal e são considerados estáveis no
serviço público. O Artigo 19 do Ato das Disposições Transitórias, da Constituição Federal, preceitua que “Os
servidores públicos civis da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, da administração direta, autárquica e das fundações públicas, em
exercício na data da promulgação da Constituição, há pelo menos cinco anos
continuados, e que não tenham sido admitidos na forma regulada no Art. 37, da
Constituição, são considerados estáveis no serviço público”. (...) Consultado
por este jornal, o maestro Antonio Neves Campos informa que assumiu a direção
do Conservatório em 1984 e, seguramente, um número considerável de professores
que deverá ser submetido ao processo seletivo trabalhava na escola nesta época
e permanece até hoje no cargo” .Item 5: “MOÇÃO DE REPÚDIO DA CÃMARA. Demissão de Neves começa a repercutir.
- A demissão do maestro Antonio Carlos Neves de Campos, diretor artístico
do Conservatório de Tatuí, publicada em primeira mão pelo Jornal Integração
deste fim de semana, começa a repercutir na comunidade. Existe um clima de
revolta pela ação do Conselho da Associação dos Amigos do Conservatório de
Tatuí, em destituir o maestro de seu cargo. O ato também começa a repercutir na
Câmara Municipal de Tatuí. Na tarde desta sexta-feira, o vereador Joaquim Amado
Veio Quevedo (PSB), prefeito na época da nomeação de Neves para a direção do
Conservatório, inconformado com sua demissão, apresentou uma Moção de Repúdio a
este ato no Poder Legislativo. Esta moção deverá ser lida e votada no
expediente de segunda-feira (17), por todos os vereadores. Neste documento, que
fará parte dos anais da Câmara, o vereador Véio Quevedo lembra que “Neves teve
a competência, durante todos estes anos, para administrar este patrimônio
(Conservatório), que fez com que nossa cidade seja conhecida como Capital da
Música”. O vereador ainda dispara: "que esta decisão, absurda e injusta,
foi tomada por um conselho que se intitula ‘Amigos do Conservatório de Tatuí’”.
E arremata: "infelizmente, estas pessoas, não tem qualquer apreço pela
Capital da Música".(n.n.). Item
6: “MOÇÃO ARQUIVADA. Na mesma sessão, uma moção de repúdio pela demissão
do maestro Neves do Conservatório, apresentada pelo vereador Joaquim Amado Veio
Quevedo, foi arquivada. Fábio Menezes, presidente do Poder Legislativo, explica
que os vereadores optaram pela moção de aplauso ao maestro Neves e deu a
entender que esta seria uma forma mais elegante de manifestar a desaprovação
pela sua demissão”.
Alega
o Autor, mais adiante, que os textos
acima “caluniam, difamam e injuriam o Autor, ferindo-lhe a
dignidade e o decoro, atos que se enquadram nas disposições dos artigos 17, 20,
21 e 22 da Lei de Imprensa.”
Diga-se,
de início, que esse entulho autoritário - no qual o Autor escora os crimes
supostamente cometidos pelos Réus, felizmente foi abolido do cenário jurídico
brasileiro. Com efeito, o colendo Supremo Tribunal Federal, no acórdão
referente à ADPF 130-7 – Distrito Federal – majoritariamente declarou não
recepcionada, pela vigente Constituição da República, a Lei n. 5.250/67 (Lei de Imprensa).
Não
se alegue que os dispositivos legais em comento – quando da propositura desta
ação – em 16 de março de 2009 - estavam
vigendo, pois os artigos 20, 21 e 22 já não o estavam, face à
suspensão deles, decretada em 21/02/2008, através de decisão proferida, em
caráter liminar, pelo Supremo Tribunal Federal, na ADPF 130-7, Rel. Min. CARLOS
BRITO.
Aliás,
o Autor é reincidente no que tange à utilização de normas revogadas para
amparar seus pretensos direitos. Assim é que, anteriormente, afirmou que “A maneira de jornalismo praticada pelos Réus, s.m.j.,
fere a Constituição Federal, as disciplinas do Código de Ética dos Jornalistas
Brasileiros, o Decreto n. 83.284 e a Lei 5.250 de 9 de fevereiro de 1967.”
Ora,
tal Decreto também teve sua vigência suspensa pelo STF, já em 21.11.2006 (AC
1406 QO-MC/SP, Rel. Min. GILMAR MENDES).
Em
conseqüência, não é a maneira do jornalismo praticada pelos Réus que fere a
ética. Quem, na verdade, fere a ética – no caso a do cidadão – é o Autor,
por ingressar em Juízo amparando-se em leis que não podem ser aplicadas.
Por
outro lado, não há, nas publicações referidas, nada, absolutamente
nada, de que se possa dizer ofensivo à honra e à imagem do Autor. Quanto à publicação do item 1, mesmo fora
do seu contexto, seria mais fácil ver um chifre na cabeça de um cavalo do que qualquer ofensa – seja direta,
reflexa ou oblíqua – à honra ou à imagem do Autor. Por acaso, não é verdade que o Conservatório
– nos seus 55 anos de tradição, foi administrado por tatuianos?
Por acaso, não é verdade que o Conservatório goza de grande prestígio
internacional? E em quê essa tradição e
esse prestígio ofendem a honra e a imagem do Autor? Demais, uma coisa é ofender; outra, sentir-se
ofendido. A lei não protege a sensibilidade exacerbada, aquela que se desgarra
do – como diriam os romanos - quod
plerumque accidit.
Por
outro lado, ainda que, por hipótese, fossem o texto enfocado, e todos os
demais – de que ainda se irá referir -
maculáveis - haveria de
prevalecer o direito - mais do que o direito -, o dever de o jornal informar
qualquer notícia de interesse público – como o é, tudo que se relacione ao Conservatório de
Tatuí. Em nenhuma das publicações, referiu-se à vida privada do Autor. Em nenhuma,
bisbilhotou-se. Em nenhuma, invadiu-se a esfera sagrada de sua vida
pessoal. Apenas se cumpriu o dever de
informar um povo que – por sua vez – tem o direito constitucional
de ser informado – no que for de seu
legítimo interesse. E ninguém pode negar que essa Instituição é de
interesse público – e relevante!
Abstração feita de que “notoria vel manifesta non egent
probatione”, o próprio Autor se encarregou dessa prova, ao cavar,
espertamente, uma entrevista no prestigioso “O Progresso de Tatuí” (23.08.09, pag. B-03). Na entrevista ainda quente,
fala da importância do Conservatório,
para o povo: “Esta importância exagerada que dão ao Conservatório
(...)”
Exagerada, na verdade, não é a “importância que
dão ao Conservatório”, mas a que o Autor dá-se a si mesmo quando
– nessa mesma entrevista – só faltou cantar cururu e sapatear num fandango para
se fazer popular. Em caipira, já se transmudou, tanto que, como ele
confessa, “(...) Até a botinha eu já tenho! Olha aqui! Esse acesso de despersonalização pode até
render-lhe algumas simpatias, mas certamente não vai adiantar nada perante o Poder Judiciário, no que tange a esta causa
sub judice.
Caipira
ou não, pouco importa! O fato é que -
pela função que exerce e pelo cargo que ocupa - o Autor também é homem público.
E, como tal, sujeito às criticas em relação ao
desempenho de sua
administração. Assim, mesmo que, por hipótese, tivesse a honra do
Autor sido atingida pelas publicações, faltaria à crítica, para configurar a
responsabilização civil dos Réus, o chamado “dolo específico”.
Esse é o magistério jurisprudencial do E. Superior Tribunal de Justiça (RECURSO
ESPECIAL Nº 719.592 - AL (2005/0011894-5), Rel. Min. JORGE SCARTEZZINI):
RECURSO ESPECIAL - RESPONSABILIDADE CIVIL – DANO MORAL
- LEI DE IMPRENSA - ACÓRDÃO - OMISSÃO - AFRONTA AO ART. 535 DO CPC -
INOCORRÊNCIA - ART. 49 DA LEI Nº 5.250/67 - DIREITO DE INFORMAÇÃO - ANIMUS NARRANDI - EXCESSO
NÃO CONFIGURADO - REEXAME DE
PROVA - INADMISSIBILIDADE - SÚMULA 07/STJ -
DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL - AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA - RECURSO NÃO
CONHECIDO.
Lê-se, no corpo deste v. acórdão:
(...) 3. No que pertine à honra, a
responsabilidade pelo dano cometido através da imprensa tem lugar tão-somente
ante a ocorrência deliberada de injúria, difamação e calúnia, perfazendo-se imperioso demonstrar
que o ofensor agiu com o intuito
específico de agredir moralmente a vítima. Se a matéria jornalística se
ateve a tecer críticas prudentes (animus criticandi ) ou a narrar fatos de
interesse coletivo (animus narrandi ), está sob o pálio das "excludentes
de ilicitude" (art. 27 da Lei nº 5.250/67), não se falando em responsabilização
civil por ofensa à honra, mas em exercício regular do direito de informação.
(...)
Cinge-se a questão à aventada ilicitude da conduta dos recorridos ao
divulgarem, por meio de veículo de comunicação de massa, notícias contendo
passagens caluniosas, difamatórias e injuriantes acerca do recorrente, em
ofensa a sua honra, caracterizando-se, desta forma, o dano moral, e impondo-se,
por conseguinte, sua reparação. A responsabilidade civil decorrente de abusos
perpetrados por meio da imprensa abrange a colisão de dois direitos
fundamentais, quais sejam, a liberdade de informação ou comunicação (art. 5º,
IV, V, IX e XIV, da CF/88), e a tutela dos direitos da personalidade, com
destaque à honra, imagem e vida privada (art. 5º, V e X, da CF/88). Em outros
termos, a atividade jornalística deve ser livre para exercer, de fato, seu
mister, é dizer, informar a sociedade acerca de fatos cotidianos de interesse
público, ajudando a formar opiniões críticas, em observância ao princípio
constitucional consagrador do Estado Democrático de Direito (art. 1º, caput, da
CF/88); contudo, o direito de informação não é absoluto, devendo os
profissionais da mídia se acautelar com vistas a impedir a divulgação de
notícias falaciosas, que exponham indevidamente a intimidade ou acarretem danos
à honra e à imagem dos indivíduos, em ofensa ao princípio constitucional da
dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF/88).
Ora,
quer se considere o embate entre direitos individuais fundamentais, quer, como
visto, entre verdadeiros princípios constitucionais, a solução, em ambas as
hipóteses, encontra-se na antevisão do caráter relativo dos interesses em jogo,
impositiva da respectiva harmonização ou convivência pacífica, de maneira que a
preponderância de um dos direitos ou princípios face às peculiaridades de
determinada situação concreta não importa a invalidade ou exclusão, mas apenas
a mitigação momentânea, do direito ou princípio contraposto.
Assim,
não se olvidando a necessidade de se resguardar a honra das pessoas face à
liberdade de imprensa, tem-se que, em atenção ao direito geral de acesso a
informação de interesse público, determinadas condutas jornalísticas, conquanto
objetivamente lesivas à honra alheia, estão expressamente abarcadas pelas denominadas
"causas legais excludentes de ilicitude" e, portanto, impeditivas da
responsabilização civil do agente.
(...)
Portanto, em linhas gerais, no que pertine à honra, nem todo ato causador de
dano gera o dever de indenizar: a responsabilidade pelo dano imaterial cometido
através da imprensa tem lugar tão-somente ante a constatação da ocorrência
deliberada de injúria, difamação e calúnia, perfazendo-se imperioso demonstrar
que o ofensor agiu com o dolo, o intuito específico (elemento subjetivo) de agredir
moralmente a vítima. De outro modo, se a matéria jornalística se ateve a tecer
críticas prudentes (animus criticandi ) ou a narrar fatos de interesse coletivo
(animus narrandi ), não há que se falar em responsabilização civil por ofensa à
honra mas em exercício regular do
direito de informação.
Neste contexto, devem os operadores
de mídia prevenir-se para, a pretexto de narrar fatos ou expor críticas e
opiniões, não incorrer em exagero ou sensacionalismo, limitando-se, ao revés, à
emissão de juízos axiológicos sobre os fatos noticiados, muitas vezes
objetivamente desabonadores, sem descambar
intencionalmente para ataques pessoais, sob pena de, aí sim, exceder os
liames das excludentes anímicas, resvalando
ao campo da
responsabilização civil. .Nesse
passo, válidas são as lições do mestre RUI
STOCO, verbis : "São figuras de ofensa ao sentimento de honra, em
sentido estrito: a) a difamação , que consiste na imputação de fato
ofensivo à reputação de pessoa física ou jurídica, atingindo-a no conceito ou
na consideração a que tem direito; b) a injúria , que consiste na ofensa
à dignidade ou ao decoro, a saber, a expressão ultrajante, o termo pejorativo
ou simplesmente a invectiva de conteúdo
depreciativo; e c) a calúnia , que consiste na falsa imputação ou denúncia de fato definido
como crime.
(...
Expressiva messe de juristas de escol, especializados nessa matéria, e que
nos dão adminículos e luzes sem as quais não se pode posicionar-se com
adequação, é unânime em afirmar que, em sede de ofensa à honra e das
questões periféricas que a circundam, a responsabilização só encontra suporte
quando demonstrado o elemento volitivo de ordem puramente subjetiva . (...)
Tanto o ilícito penal contra honra como o ilícito civil decorrente da ofensa
a ela, em qualquer de suas modalidades, inclusive quando praticado através da
imprensa, não podem existir senão mediante o dolo específico que lhe é
inerente, isto é, a vontade consciente de ofender a honra ou a dignidade da
pessoa . Há de emergir clara a intenção de beneficiar-se ofendendo,de
enaltecer-se diminuindo ou ridicularizando o outro, ou de ofender, seja por
mera emulação, retorsão, vingança, rancor ou maldade. Além dessas condutas
impregnadas com essa vontade desprovida de ética, o que remanesce é o direito
de expressar livremente o pensamento. Não se dispensa o elemento
intencional, seja na calúnia, na difamação ou na injúria. Não há o ilícito
quando o sujeito pratica o fato com ânimo diverso, como ocorre na hipótese de
'animus narrandi'. (...) Em síntese, 'não basta que as palavras sejam
aptas a ofender; é mister que sejam proferidas com esse fim' (...)".
("Tratado de Responsabilidade Civil", 6ª ed., São Paulo, Ed. Revista
dos Tribunais, 2004, pp. 781/782). Nesta esteira, o escólio, respectivamente,
dos insignes DARCY ARRUDA MIRANDA e SÉRGIO CAVALIERI FILHO:
"O 'animus narrandi' exclui o dolo. A imprensa, como veículo de
informações, veria cerceada a sua liberdade se não pudesse narrar os fatos correntes em toda a sua crueza, em toda a sua
pungente ou insultante realidade. Para o jornalista, a narração da verdade
sobreleva toda e qualquer consideração de ordem pessoal ou política, porque ela
se lhe impõe como dever funcional . (...). O 'animus narrandi' exclui,
igualmente, o 'animus iniuriandi', desde, porém, que não exceda os limites
necessários e efetivos da narrativa. Ausente que seja a boa-fé da narração do
fato, presente estará, por força, o ânimo de injuriar . (...). A
dignidade e o decoro do cidadão devem estar a salvo do acúleo das críticas
apressadas e do desvirtuamento da verdade. Não se pode, a pretexto de narrar um
fato, atassalhar a honra do que se acha nele envolvido, a não ser que esta não
possa daquele desprender-se . (...).
Esse também é o entendimento do
colendo Supremo Tribunal Federal, na lição, sempre magistral, do eminente
Ministro CELSO DE MELLO:
Uma vez dela
ausente o “animus
injuriandi vel diffamandi”, tal como ressalta o magistério doutrinário
(CLÁUDIO LUIZ BUENO DE GODOY, “A Liberdade de Imprensa e os Direitos da
Personalidade”, p. 100/101, item n. 4.2.4, 2001, Atlas; VIDAL SERRANO NUNES
JÚNIOR, “A Proteção Constitucional da Informação e o Direito à Crítica
Jornalística”, p. 88/89, 1997, Editora FTD; RENÉ ARIEL DOTTI, “Proteção
da Vida Privada e Liberdade de Informação”, p. 207/210, item n. 33, 1980,
RT, v.g.), a crítica que os meios de comunicação social dirigem
às pessoas públicas, especialmente às autoridades e aos
agentes do Estado, por mais acerba, dura e veemente que possa ser, deixa
de sofrer, quanto ao seu concreto exercício, as limitações externas que
ordinariamente resultam dos direitos da personalidade. (ADPF 130-7 DF).
Com relação ao texto do item 2, cuja rubrica é
“MUDANÇA NO CONSERVATÓRIO”, aponta-se
mais uma infringência ética por parte do autor. É que,
propositalmente, ele subtraiu o ponto de interrogação, da frase, objetivando
transformar uma pergunta em uma afirmação.
Além do mais, o texto trata de uma mera
especulação, como o jornal define no próprio título.
Quanto à sua foto, tirada em local público, que
ilustra a matéria, o periódico apenas registrou sua presença na posse solene da
Câmara Municipal de Tatuí. É evidente
que se o Autor estava sozinho, só poderia sair isolado na fotografia. Não há,
nem houve, da parte do jornal, nenhuma intenção de insinuar qualquer isolamento
social por parte do Autor. Por isso, se
o Autor entende que uma foto dele, nestas circunstâncias, causa-lhe
constrangimento, que passe, doravante, a andar publicamente acompanhado.
Aconselha-se, também que, da próxima vez e na condição de Diretor da maior
Instituição Musical da América Latina, o Autor, ao comparecer a uma solenidade
daquela magnitude, o faça com uma indumentária mais apropriada para a ocasião.
Quanto ao texto do item 3, o Autor aponta, mais
adiante (fls. 16, “in fine”), a frase
que teria sido ofensiva à sua honra:
“...Portanto, do Ministério
Público a atual diretoria do
Conservatório não escapa”. Ora, como já se disse
alhures em relação a todos os textos,
não há nada de ofensivo nesta afirmação.
Com efeito, não é só a Diretoria do Conservatório que não escaparia
de uma eventual fiscalização por parte
do Ministério Público. Na verdade, nenhuma Diretoria de Instituição Pública pode pretender-se imune
à ação ministerial. Não se falou em condenação. O Autor se adiantou desnecessariamente.
O
fato é que o Autor não gosta de dar
informações sobre o andamento
do Conservatório. Tanto assim que, ao receber um questionário enviado
pelo Jornal, recusou-se a respondê-lo (DOC. 1).
Esta recusa inexplicável não poderia deixar de levar o periódico a pensar em
recorrer – como era de seu direito se o
fizesse – ao Ministério Público. A propósito, consta da nota da redação, as
providências por parte desta nobre Instituição, através do ilustre Promotor de Justiça, Dr. Alexandre
Magalhães, da Primeira Vara desta Comarca.
Relativamente
ao texto do item 4, trata-se apenas de notícia, cuja fonte é o prestigioso
Jornal “O Estado de São Paulo”, na entrevista concedida pelo Secretário da
Cultura, João Sayad, sobre o processo de “celetização” do Conservatório.
Portanto, fundamentalmente, o “Integração”
nada mais fez que se reportar ao assunto, adaptando-o às
circunstâncias locais (DOC. 2).
Quanto aos itens 5 e
6, cujas chamadas são, respectivamente, “Moção de Repúdio da Câmara”
e “Moção Arquivada”, o “Integração”, a exemplo do que ocorreu em relação ao
item 4, simplesmente se reportou à Moção n. 304/08 (Moção de Repúdio), apresentada
pelo vereador Joaquim Amado Quevedo (DOC. 3),
e à Moção n. 305/08 (Moção de Aplauso) (DOC. 4).
Vê-se, pois, que, nos textos produzidos pelos Réus,
não há, como já se disse, absolutamente nada que possa configurar uma ofensa à
honra ou à imagem do Autor. Na verdade, o Autor promoveu a presente ação com o
propósito, ainda que disfarçado, de obter uma censura judicial, ao jornal.
Não se trata de censura prévia, obviamente, mas, de
qualquer forma, uma censura, o que é
extremamente lamentável, por violentar a liberdade de pensamento e de
expressão, garantidas pela Constituição Federal. Embora não se trate de censura
prévia, quer-se, com esta ação, a obtenção do mesmo efeito. O valor pleiteado
ou sugerido pelo Autor, no importe de 40 salários mínimos, a título de
indenização, além de ferir a Lei 6.205, de 29/4/1975, levaria, simplesmente, ao
fechamento do jornal, conforme se demonstrará mais adiante, tendo em vista o
princípio da eventualidade.
Sem dúvida, a presente ação é mais um dos atentados à
liberdade de imprensa, arduamente conquistada após o tenebroso período da
ditadura militar.
A respeito da
importância da liberdade de imprensa para a democracia, não se pode olvidar que
a Declaração de Direitos do Estado de Virginia, de 1776, reconheceu de modo
expresso, a liberdade de expressão através
da imprensa. Essa liberdade também
foi proclamada na
Declaração dos Direitos
do Homem e do
Cidadão, de 1789. O mesmo se diga
da
Declaração Universal dos
Direitos Humanos, de 1789, da
Declaração Universal dos
Direitos Humanos de 1948, do Pacto Internacional dos Direitos Civis e
Políticos,
de
1966, da Convenção Européia para a Proteção dos Direitos Humanos e das
Liberdades Fundamentais e da Convenção Americana de Direitos Humanos.
A nossa Carta
Política, por sua vez, em seu artigo 5º, incisos IV, IX, XIV, proclama “que
é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”,
e que “ é livre a expressão da atividade intelectual, artística,
científica e de comunicação, independente de censura ou licença” e que “ é assegurado a todos o acesso a
informação”. Daí porque, em
seu memorável voto, relativo à já citada
ADPF 130-7, adverte o decano do Supremo, o
eminente Ministro CELSO DE MELLO:
“Impende
advertir, bem por isso, notadamente
quando se busca promover a repressão à crítica jornalística, que o
Estado não dispõe de poder algum sobre a palavra, sobre as idéias e
sobre as convicções manifestadas pelos profissionais dos meios de
comunicação social.
Essa garantia
básica da liberdade de
expressão do pensamento, como precedentemente assinalado, representa,
em seu próprio e essencial significado, um dos fundamentos em que
repousa a ordem democrática. Nenhuma autoridade pode prescrever o
que será ortodoxo em política, ou em outras questões que envolvam
temas de natureza filosófica, ideológica ou confessional, nem estabelecer
padrões de conduta cuja observância implique restrição aos meios de divulgação
do pensamento. Isso, porque “o direito de pensar, falar e escrever
livremente, sem censura, sem restrições ou sem interferência governamental” representa,
conforme adverte HUGO LAFAYETTE BLACK, que integrou a Suprema
Corte dos Estados Unidos da América, “o mais precioso privilégio dos
cidadãos...” (“Crença na Constituição”, p. 63, 1970, Forense)”.
Por outro lado, no seu artigo 220, dispõe a nossa Magna
Carta que esses direitos não poderão sofrer nenhuma restrição, observada a
própria Constituição, acrescentando que nenhuma lei poderá embaraçar a liberdade de informação jornalística, repelindo
toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística. A
propósito do exercício dessa liberdade, observe-se a magnífica lição de ENÉAS
COSTA GARCIA:
“Nem toda conduta causadora de dano gera o dever de
indenizar. A ordem jurídica, na consideração de interesses superiores, admite
algumas lesões a direitos subjetivos, sem a respectiva responsabilidade civil
do agente. “Há certos atos que, embora causem prejuízo a outrem, não são
considerados ilícitos. Sê-lo-iam, se não cometidos em determinadas
circunstâncias, que a lei leva em conta para autorizar sua prática, ou para
escusá-la”.
O
art. 160 do Código Civil elenca as causas excludentes de ilicitude. Dentre as
causas arroladas, no campo do conflito com a liberdade de imprensa,
praticamente não haverá oportunidade para invocação da legítima defesa ou
estado de necessidade.
Todavia
há uma causa de exclusão da ilicitude que está intimamente ligada ao conflito
objeto de exame, qual seja: o exercício regular de um direito.
Na
lição de Planiol: “Porque a culpa é um ato contrário ao direito (ilícito), daí
resulta uma conseqüência importante: se eu tenho direito de fazer um ato
determinado, não estarei em culpa por tê-lo realizado; e se tenho direito de
abster-me, não incidirei em culpa por ter-me omitido. Por conseguinte, eu não
devo nada a ninguém, qualquer que seja o prejuízo que minha ação ou minha
abstenção tenha causado a outrem.”
A
irresponsabilidade pelos danos ocorridos no exercício regular de um direito é
regra tradicional, pois “não causa dano
a outrem quem utiliza um seu direito.” (“neminem laedit qui suo jure utitur”). (RESPONSABILIDADE CIVIL DOS MEIOS DE
COM. - 2002 – Ed.: Juarez de Oliveira,
1ª Ed., 2002).
Não só os grandes nomes da ciência jurídica proclamam
por essa liberdade. Também a proclamam expoentes de todas as atividades humanas
e de todas as classes sociais, como por exemplo, o grande poeta FERREIRA GULLAR
(“Folha”, 23.08.09, E9): “Imprensa livre e regime
autoritário não podem coexistir, e a razão é óbvia: a informação livre e a
opinião independente são intoleráveis a quem se julga dono da verdade e
inseguro quanto à legitimidade de seu poder. É verdade, porém, que não só os
ditadores e os tiranos que odeiam a imprensa livre. As pessoas de um modo geral
não aceitam ser criticadas, e os políticos, especialmente, uma vez que o bom
êxito de sua carreira depende da opinião pública”.
Como diz o
renomado filósofo JOSE ARTHUR GIANOTTI (“Estadão”,
16.08.09, A11),”Um jornal não
pode ser confundido com um
boletim científico ou um jornal
oficial. Obtida uma informação
interessante, cabe ao jornal publicá-la; obviamente, assumindo os riscos se ela
for exagerada, se informar além do intervalo aceito pelos costumes e pela
jurisprudência.”
Vejam-se outras manifestações no mesmo sentido:
Na matéria “Atentado à democracia”, a Associação Nacional dos Jornais alerta
que juízes de primeira instância fazem ressurgir o fantasma da censura. Nos
últimos doze meses, segundo a matéria, foram registrados 31 casos de violação à
liberdade de imprensa. Destes, dezesseis decorrentes de sentenças judiciais, em
geral, proferidas por juízes de primeira instância. Para a ANJ trata-se de uma
anomalia e de uma temeridade. (“Veja”,
p. 100, Ed. 26/8/2009),
O Jornal “Estadão”, em sua principal página, informa
que “a liberdade de imprensa não corre risco no País e o
jornal tem autoridade histórica para o afirmar. A publicação cita o repúdio à censura, consignado na Constituição
Federal, e a revogação da Lei de Imprensa, pelo STF, colocando fim a um diploma
legal típico da ditadura. O jornal conclui que “o papel da imprensa é fundamental para preservação
das liberdades, quando muitas instituições do Estado se desviam deu suas
verdadeiras finalidades”. (“Estadão”,
16/8/2009, pag. A3).
Em artigo “Liberdade de expressão e interesse
público”, MARIA GARCIA, livre docente em Direito Constitucional pela PUC/SP,
reportando-se à inaceitável censura imposta pelo Poder Judiciário ao “Estadão”,
lembra que “interesse público, numa das
suas melhores acepções, é o bem social indisponível e transcendente aos
interesses individualizados”.
(“Estadão”, 21/8/2009, pag. A8).
CARLOS ALBERTO DI FRANCO, doutor em Comunicação pela
Universidade de Navarra, afirma: “a
transparência informativa é essencial para a renovação do País. A imprensa
brasileira, sem as mordaças que alguns teimam em recriar, tem papel decisivo na
purificação das nossas práticas políticas e administrativas”. (“Estadão”, 15/6/2009,
pag. A2).
O juiz do Trabalho GUILHERME GUIMARÃES FELICIANO, em artigo “Justiça, mídia e ficção”, afirma
categoricamente: “a liberdade de
expressão artística é valor constitucional irrefragável. Não se concebe a idéia
mesma de Estado democrático de Direito sem que se assegure aos artistas em
geral o direito de obviar, debater, criticar, censurar ou mesmo escarnecer”. E finaliza:
“que o cartaz da livre expressão não oculte, nesses tempos confusos, um enredo
de preconceito e desinformação”. (“Folha”, 23/7/2009, pag. A3).
RENÉ ARIEL DOTTI, advogado e professor da Faculdade de
Direito da UFPR, no artigo “O diálogo entre a corda e o pescoço”, ao comentar
sobre a liberdade de imprensa, lembra: “Surge
a tendência de fazer do jornalismo uma atividade de risco para autorizar
onerosas indenizações. Isso é péssimo para a democracia”. (“Folha”, 25/7/2009, pag. A3).
GAUDÊNCIO TORQUATO, jornalista e professor da USP, no
artigo “ Aterradora figura na Torre de Babel”, sobre a liberdade de imprensa
assegura: “Um dos mais
sólidos fundamentos – ético e
político – do sistema democrático mundial é a
liberdade de expressão (...) A construção do edifício jurídico da comunicação
no Brasil, como se pode aduzir, é uma Torre de Babel. Sobra dissenso e falta
bom senso”. (“Estadão”, 14/6/2009, pag. A2).
Sob o título “STJ isenta TV na primeira decisão sem
Lei de Imprensa”, a Ministra do STJ NANCY ANDRIGHI assegura: “O veículo de comunicação exime-se de culpa quando
busca fontes fidedignas, quando exerce atividade investigativa, ouve as
diversas partes interessadas e afasta quaisquer dúvidas sérias quanto à
veracidade do que divulgará. Pode-se dizer que o jornalista tem um dever de
investigar os fatos que deseja publicar”. (“Estadão”, 30/5/2009, pag. A7).
No caso específico deste processo contra o Jornal
Integração, o “Estadão”, preocupado com a sobrevivência dos pequenos jornais,
em matéria opinativa, alerta o Poder Judiciário: “A existência de jornais é essencial para o exercício
do direito dos cidadãos à informação.” (...) “É por isso que os tribunais precisam
ser cuidadosos aos julgar as ações impetradas com óbvios fins intimidatórios
contra os pequenos jornais do interior. Se não souber separar o joio do trigo,
aplicando penas pecuniárias que levam ao fechamento dessas publicações, a
Justiça poderá comprometer liberdades públicas que tem o dever de preservar e
garantir”. (“Estadão”,
27/6/2009, pag. A3).
Não se
pode olvidar que a responsabilidade da imprensa é de ordem subjetiva,
mesmo em face da revogada Lei 5.250/67. Esse é o entendimento dos nossos
Tribunais:
RESPONSABILIDADE
CIVIL – Indenização – Dano moral – Publicação, em jornal local, de carta de
deputado estadual criticando os desmandos do Executivo municipal no trato com o
desvio de verbas com “funcionários fantasmas” – Conduta regular que apenas
buscou assegurar o direito constitucional à livre manifestação do pensamento –
Verba indevida. (...) A
responsabilidade civil da empresa jornalística, mesmo em caso de referendum de
artigo alheio nominado ou não, em espaço próprio ou comprado das páginas dos
diários populares, não é nem poderia ser de ordem objetiva. Depende da culpa
(arts. 159, do CC, 49 e 50 da Lei 5.150/67 [sic]) e também do nexo de
causalidade entre o ato e o dano que se busca recuperar, tal como se requer em
ações de índoles indenitárias do campo
privado.
Não
fosse assim, não existiria liberdade de imprensa ou de informação, um fato
importante para o regime democrático. (RT 756/ 211).
INDENIZAÇÃO – Publicação de crônica policial narrando
fato constante de ocorrência registrada – Divulgação que se reveste de
interesse público, prestigiando o direito à informação consagrado no Texto
Constitucional – Verba indevida – Inteligência dos arts. 5º., XIV, e 290, § 1º,
da CF. É indevida a indenização por
reparação de dano por empresa jornalística que publica crônica policial
narrando fato constante de ocorrência registrada, pois a divulgação de tais
matérias reveste-se de interesse público, prestigiando, assim, o direito à
informação consagrado na CF em seus arts. 5º, XIV, e 290, § 1º. (RT-745/355).
Lê-se, no corpo deste acórdão: VOTO
– O Exmo. Sr. Des. Araken de Assis –
relator – Sr. Presidente. 1. Segundo a
prova dos autos, a notícia do envolvimento do apelante em certo episódio, do
qual resultou processo-crime, não se deveu a nenhum propósito peculiar de
atingir sua imagem e sua honra. Cingiu-se ela a reproduzir ocorrência policial,
antes do início da ação penal. É lícita semelhante divulgação – o “ato de
publicar a matéria”, consoante insiste e reclama o apelante, ainda desconhecida
do público –, considerando a proteção constitucional desses bens (art. 5º, V,
X, da CF/88)? Evidentemente, a
questão aflora em diversos países e mereceu estudo brilhante de François Rigaux
(“La liverté de la vie privée”, p. 539-563, publicado na Revue internationale
de droit compare, 43º, ano, jul./set. de 1991, n. 3. Paris, 1991). É claro que
o apelante não é homem público, e, nesta qualidade, sujeito à crítica pública e
à divulgação de seus atos. Mesmo assim, considero correto o alvitre de Rigaux (op.
Cit., n. 16, p. 553): “Suf quand il y
est dérogé par une ordannance huis-clos, le déroulement du process penal est
soumis à une exigence de publicité qui contredit le respect de la vie privée
(salvo quando é derrogado por uma liminar de silêncio, o desenvolvimento do
processo penal é submetido à exigência de publicidade que contraria o respeito
à vida privada)”.
Do
contrário, a crônica policial estaria banida das páginas de todos os jornais. Em outras palavras, à exceção dos
casos patológicos de deturpação da verdade e de sensacionalismo flagrante, não
há como impedir a divulgação das investigações policiais e do desenvolvimento
do processo-crime. Entre nós, é a opinião de René Ariel Dotti (Proteção da vida
privada e liberdade de informação, São Paulo, 1980, p. 212-213):“A crônica
policial – através da imprensa, do rádio e da televisão, principalmente – tem
base jurídica no direito geral à informação e se conexiona com o caráter
publicista dos processos criminais”.
DANO MORAL – Indenização – Autor da pretensão que não
conseguiu demonstrar que aquele que manifestou livremente o pensamento prestou
declarações falsas e com a intenção de ofender a sua honra e denegrir a sua
imagem – Verba indevida – Inteligência do art. 5º, X, da CF. Ementa Oficial: Não cabe
indenização, por danos morais, com fundamento no art. 5º, X, da CF, se o autor
da ação não consegue demonstrar que aquele que manifesta livremente o
pensamento presta declarações falsas (difamatórias ou caluniosas), com a
intenção de ofender a sua honra e denegrir a sua imagem. (RT 778/ 373).
Indenização. Dano moral. Imprensa. Matéria
jornalística verdadeira. Direito de veiculação. Ação improcedente. Recurso não
provido – “É legítima a notícia sobre uma prisão, ou indiciamento em inquérito
policial ou de alguém que está sendo processado criminalmente. Mesmo que, no
final da investigação, o sujeito saia livre da imputação criminosa, o órgão de
comunicação não deixou de agir senão no exercício regular de um direito” (TJSP – 3ª C. Dir. Privado – Ap.
21.871-4/2 – Rel. Mattos Faria – j. 10.02.98 – Voto 12.641).
Indenização. Danos materiais e morais decorrentes de
ato ilícito atribuído a empresa jornalística. Divulgação não abusiva dos fatos
constantes de documento policial. Irrelevante a circunstância de posterior
absolvição por falta de provas suficientes. Ausência de propósito doloso ou
culposo de ferir a honra do acusado. Notícia que embora não reproduza o auto de
prisão em termo técnico, se além nos limites aceitáveis. Inexistência de
violações contempladas no art. 49 da Lei 5.250/67. Decisão mantida. Recurso
improvido (TJSP – 7ª C. Dir. Privado – Ap. 53.138-4 – Rel. Vasconcellos
Pereira – j. 20.10.98 – JTJ-LEX 217/88).
Abuso de direito de informar. Não-caracterização.
Indenização indevida. “Apelação cível. Responsabilidade civil. Dano moral.
Ofensa à honra de governador, por advogado. Veiculação através de jornal e de
programa de televisão. (...) – Não caracteriza injúria à pessoa do autor a
utilização de qualificativos expressivos, seja na publicação de “A pedido”,
intitulada A Lógica do Razoável, seja através de entrevista televisiva, no
programa “Acuso”, abordagem de assuntos de alta transcendência para a opinião
pública posto que alusivas a questões de alto interesse dos governados quanto a
assuntos de Estado. Juízos críticos, assim reconhecidos, mas inseparáveis dos
fatos ocorrentes. Matéria exposta ao público após degravação de fita magnética.
O homem público, enquanto age nesta condição, está sujeito à divulgação de
fatos que mereçam ou não, a reprovação da opinião pública. Réu que,
profissional advogado, se encontrava sob o manto da imunidade assegurada pelo
art. 133 da CF e do art. 2º, § 1º do Estatuto da Advocacia. Ação julgada
improcedente. Preliminares rejeitadas, apelo do réu provido e improvida a
apelação do autor, por maioria. (TJRS, Apelação Cível n. 70005429246, 5º
Câm. Cível, j. 2.10.2003, Rel. Leo Lima – Fonte: Site do Tribunal).
Indenização.
Divulgação de fato verdadeiro. Não-cabimento. “A
ação indenizatória. Veiculação de fato verdadeiro pela imprensa. Não
configuração do crime de calúnia. Indenização indevida. Tratando-se de notícia
com cunho de veracidade, o emprego de expressões utilizadas usualmente em
processos criminais, não configura a prática do crime de calúnia e tampouco
outorga o direito de pleitear indenização. Apelação desprovida, por maioria.” (TAPR,
Ap. Cível n. 0153237-6/Curitiba, Ac. 15886, 6ª Câm. Cível, maioria, j.
18.2.2003, Rel. Luiz conv. Jucimar
Novochadlo – DJ 8.8.2003).
Animus narrandi. Ofensa à honra não caracterizada. “Ação de indenização por dano moral contra
empresa jornalística por divulgação de matéria policial, informando a remessa
de inquérito à justiça envolvendo uma quadrilha por furto de veículos, em que
foi indiciado o autor da ação indenizatória. O artigo jornalístico veiculado,
fundado em informações fornecidas pela autoridade policial com base em dados
coletados em intensas investigações, não revela ofensa à moral em relação ao
indiciado, pois à luz da Constituição e da Lei de Imprensa, o demandado não
ultrapassou os limites que a liberdade de imprensa lhe assegura. Apelo
improvido. (TJRS, Apelação Cível n. 70005148192, 5ª Câm. Cível, j.
30.10.2003, Rel., Marco Aurélio dos Santos Caminha – Fonte: Site do Tribunal).
“Apelação Cível – Indenização por danos morais –
Notícia publicada em jornal – Animus narrandi – Ofensa à honra não
caracterizada – Pedido improcedente – Recurso desprovido. “A imprensa, como
veículo de informações, veria cerceada a sua liberdade se não pudesse narrar os
fatos ocorrentes em toda a sua crueza, em toda a sua pungente e ou insultante
realidade. Para o jornalista, a narração da verdade sobreleva toda a qualquer
consideração de ordem pessoal ou política, porque ela se lhe impõe como dever
funcional” (Darcy Arruda Miranda. Comentários à Lei de Imprensa, 2ª ed. Revista
dos Tribunais, Tomo I, p. 259/260).” (TJSC,
Apelação Cível n. 2001.017783-8/Blumenau, 1ª Câm. Civil, v.u., j. 12.11.2202,
Rel. José Volpato de Souza – Fonte: Site do Tribunal).
“Indenização
– Jornal – Reportagem publicada em jornal de grande circulação que teria
ofendido a honra do autor – Considerações doutrinárias e jurisprudenciais – A
reportagem visou a prestação de informações de interesse da população, sendo
inerentes à atividade jornalística – Impedir que a imprensa divulgue fatos
constitui censura a liberdade de informar, vedada pelo artigo 220, parágrafo 1º
e 2º da Constituição Federal, ainda mais que houve mera reprodução de palavras
e informações de terceiros. Informou-se, tão somente – Ausência, ademais, de
dolo ou culpa a gerar direitos indenizatório – Ação improcedente – Recurso
improvido. (TJSP - APELAÇÃO CÍVEL Nº 237.009-4/0-00 Rel. Bereta da
Silveira).
Trata-se de uma decisão recente e importantíssima, do
E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, razão pela qual convém
transcrever o que consta do corpo desse acórdão:
(...) O apelante
ajuizou ação contra o apelado sob a alegação de que no dia 13 de julho de 2000,
o jornal “O Estado de São Paulo”, no caderno “Cidades”, publicou reportagem em
que consta que os vereadores do Município de São Paulo afirmaram que o autor,
como ex-secretário do então Vice-Prefeito, teria lhes oferecido vantagens,
mencionando-se na reportagem que um grupo de sambistas partidários do Prefeito
teria recebido ordem para retirar a “mala” que estava em poder do autor.
Reportagem similar foi publicada em outro jornal do réu, o “Jornal da Tarde”.
Diz que a versão do fato, publicada pelo réu apelado, é absolutamente falsa e
criou uma imagem de que o autor seria emissário de corrupção, havendo manifesto
objetivo de difamar e caluniar. A
questão passa pela análise da “Liberdade de Imprensa”. “Direitos de Informação”
e o “Direito de Privacidade”. Os
limites e direitos que garantem a Constituição Federal no que toca à liberdade
de imprensa, liberdade esta expressamente conferida pelo artigo 5º, IX e art.
220 da Carta Magna. Diz o inciso IX,
do artigo 5º da CF: “É livre a
expressão da atividade intelectual,artística, científica e de comunicação, independente
de censura ou licença”. O
artigo 220 da CF: “A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a
informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer
restrição, observado o disposto nesta Constituição”. Necessário se adentrar nos meandros do papel da imprensa,
que pode ir do pensamento de MARX, para quem “a imprensa livre é o olhar
onipotente do povo, a confiança personalizada do povo pelo mesmo, o vínculo
articulado que une o indivíduo ao Estado e ao mundo, a cultura incorporada que
transforma lutas materiais em lutas intelectuais, e idealiza suas formas
brutas. É a franca confissão do povo a si mesmo, e sabemos que o poder da
confissão é o de redimir. A imprensa livre é o espelho intelectual no qual o
povo se vê, e a visão de si mesmo é a primeira confissão da sabedoria”
(Liberdade de Imprensa, Porto Alegre: L&PM Editores, 1980, p. 42), ao do
“zé-ninguém” para quem “deu na imprensa é verdade”. (Cf. editorial “Imprensa
questionada”, Folha de S. Paulo, ed. 11/11/93, caderno 1, p. 2.11). Não se pode deixar de se ter em conta
que a liberdade de imprensa deve, sempre, vir junto com a responsabilidade da
imprensa, de molde a que, em contrapartida ao poder-dever de informar, exista a
obrigação de divulgar a verdade, preservando-se a honra alheia, ainda que
subjetiva.
A
liberdade de imprensa é bem precioso em todos os países democráticos do mundo.
Nos Estados Unidos da América, após a Declaração da Independência e a
promulgação da Constituição de 1787, as dez primeiras emendas, conhecidas como
o Bill of Rights, de 1791, vieram assegurar a proteção aos direitos
fundamentais, entre eles a liberdade da palavra (Emenda I), a inviolabilidade
das pessoas, casas, documentos e haveres contra a busca e apreensão arbitrárias
(Emenda IV) e o “due process of law” (Emenda V).Deve ser enfatizado que, no
texto original, a citada Emenda IV refere-se a papers e HENRY CAMPBELL BLACK
esclarece o exato significado dessa expressão: “Any writing or printed documents,
including letters, memoranda, legal or business documents, and books of
account, as in the constitutional provision which protects the people from
unreasonable searches and seizures in respect to their papers as well their
houses and persons”. (“Blacks Law Dictionary”, West Publishing, 1979, p.
1.001). Tradução livre: “Qualquer papel escrito ou impresso,
incluindo cartas, memorandos, documentos de negócios ou legais, extratos de
contas-corrente, a partir de uma previsão constitucional que proteja os cidadãos
de buscas ou pesquisas não autorizadas ou embargos, em relação ‘aqueles papéis
ou documentos, assim como seus lares e as pessoas”
Na
França, a Assembléia Nacional, antes mesmo de promulgar a Constituição, editou,
em 1789, sob a inspiração de ROUSSEAU, a “Declaração dos Direitos do Homem e do
Cidadão”, que inclui a liberdade entre os “direitos naturais e imprescritíveis
do homem”, ao lado da propriedade, da segurança e da resistência à opressão.
“Os homens nascem livres e são livres e iguais em direitos”, proclama o art. 1º
“A liberdade consiste em poder fazer tudo aquilo que não prejudique outrem”,
acrescenta o art. 4º. “Todo cidadão pode, portanto, falar, escrever, imprimir
livremente”, completa o art. 11.
A
liberdade de imprensa é reafirmada pelo Pacto de São José da Costa Rica em seu
artigo 13.
“Art.
13 – Liberdade de pensamento e de expressão
I-
Toda pessoa tem o direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse
direito inclui a liberdade de procurar, receber e difundir informações e idéias
de qualquer natureza, sem considerações de fronteiras, verbalmente ou por
escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer meio de sua
escolha”.
Fazendo-se
uma analogia com o Direito Eleitoral, tem-se que a orientação do Tribunal
Superior Eleitoral vai no sentido de prestigiar a liberdade de imprensa quando
não houver conotação política/partidária, como no caso dos autos. Anote-se:
“Na
imprensa escrita, o que não se pode admitir no período anterior a 5 de julho é
que seja publicado propaganda eleitoral paga, aquela que normalmente contém o
nome, a foto, a cargo que se pretende e dizeres elogiosos ao candidato”.
A
respeito, veja-se excelente monografia de Ubirajara Nicolas e Ubirajara Ruy
Nicolas, in “A Ética, a Lei de Imprensa e a Extensão do Dano Moral”
(direito.net.com.br).
No
caso dos autos, a reportagem visou a prestação de informações de interesse da
população, sendo inerentes à atividade jornalística.
Impedir
que a imprensa divulgue fatos constitui censura a liberdade de informar, vedada
pelo artigo 220, parágrafos 1º e 2º da Constituição Federal, ainda mais que
houve mera reprodução de palavras e informações de terceiros. Informou-se, tão
somente.
Acolher
o pedido inicial, neste caso, constitui CENSURA à liberdade de imprensa, vedada
pelo artigo 220, parágrafo 1º e 2º, da Constituição Federal, e o réu apelado
exerceu o seu direito constitucional de “informação”, sem “qualquer censura de
natureza política, ideológica e artística” (CF artigo 5º, inc. IV, e 220, caput
e parágrafo segundo) e de “crítica de atos e decisões do Poder Executivo ou
Legislativo e seus agentes.
A
nova Constituição do Brasil revelou hostilidade extrema a quaisquer práticas
estatais tendentes a restringir, mediante prescrições normativas ou práticas
administrativas, o legítimo exercício da liberdade de expressão e de
comunicação de idéias e de pensamento.
Isso
porque “o direito de pensar, falar e escrever livremente, sem censura, sem
restrições ou sem interferência governamental” é, conforme adverte HUGO
LAFAYETTE BLACK, que integrou a Suprema Corte dos Estados Unidos da América, “o
mais precioso privilégio dos cidadãos...” (“Crença na Constituição”, p. 63,
1970, Forense).
À
imprensa compete noticiar o que acontece e é de interesse da sociedade.
Corriqueiros
são os escândalos envolvendo pessoas públicas que penetram na esfera de sua
intimidade.
As
pessoas públicas têm amplos direitos de alegar violação de sua intimidade, desde
que o fato objeto do escândalo não tenha relação com o exercício da função
pública que lhes foi atribuída. Mas, no exercício da função pública os gestores
do dinheiro público não têm intimidade a preservar, salvo a de ordem
estritamente pessoal, já que o interesse público tem prevalência sobre o
particular.
É
verdade que a lei prevê também a reparação para o dano moral, questão esta de
sua importância, pois demonstra a intenção inequívoca do legislador de
resguardar os direitos individuais dos cidadãos ou entidades ofendidas, pois,
esta é uma forma de inibir a prática de abusos por parte dos responsáveis pelos
meios de comunicação.
Visa
a lei estabelecer o equilíbrio destruído pelo dano de tal maneira que aquele
que no exercício da liberdade de informar, com dolo ou culpa, tenha violado
direito ou causado prejuízo, deva responder pela ação lesiva ao patrimônio
moral ou material de terceiro.
Todavia,
é necessário que exista o dolo ou a culpa para que se estabeleça ao ofendido o
direito de pleitear a reparação do dano. Como em outros processos em que a
imprevisibilidade ou a inevitabilidade são causas excludentes de
responsabilidade civil, nos processos de reparação dos prejuízos causados em
conseqüência dos abusos da informação, pode ocorrer divulgação que não contenha
obrigatoriamente dolo nem culpa. Nesses casos, não cabe ao ofendido qualquer
direito ao ressarcimento do dano, seja moral, seja material. E aqui não se vislumbra dolo ou culpa na
publicação da reportagem de porte a gerar indenização como pleiteada.
Incluiu-se a reportagem dentro do direito de informação sem que isso resulte em
violação tal que implique ou resulte em dever de indenizar. Ante o exposto, nega-se provimento ao recurso.
DIREITO CIVIL. DIREITO DE IMAGEM. TOPLESS PRATICADO EM
CENÁRIO PÚBLICO.Não se pode cometer o delírio de, em nome do direito de
privacidade, estabelecer-se uma redoma protetora em torno de uma pessoa para
torná-la imune de qualquer veiculação atinente a sua imagem. Se a demandante
expõe sua imagem em cenário público, não é ilícita ou indevida sua reprodução
pela imprensa, uma vez que a proteção à
privacidade encontra limite na própria exposição realizada.Recurso especial não
conhecido. (RECURSO ESPECIAL Nº 595.600 - SC (2003/0177033-2)Relator: Min.
César Asfor Rocha).
Gilmar Ferreira Mendes, em admirável estudo sobre o tema,
mostrou diversos casos julgados pela Corte Constitucional da Alemanha (Bundesverfassungsgericht) para assinalar
que “no processo de ponderação desenvolvido para solucionar o
conflito de direitos individuais não se deve atribuir primazia absoluta a um ou
a outro princípio ou direito. Ao revés, esforça-se o Tribunal para assegurar a
aplicação das normas conflitantes, ainda que, no caso concreto, uma delas sofra
atenuação. É o que se verificou na decisão acima referida, na qual restou
íntegro o direito de noticiar sobre fatos criminosos, ainda que submetida a
eventuais restrições exigidas pela proteção dos direitos da personalidade” (Revista
de Informação Legislativa 122/297).
No
presente caso, trata-se de atuação do Juiz no tocante à defesa e proteção de
menores, presente processo de adoção e de guarda. São decisões que
necessariamente envolvem paixões e estão suscetíveis de inconformidade. Esse é
o drama da judicatura que exige do Magistrado dizer o direito deixando uma das
partes vencida. Quando tal ocorre e a parte substitui o direito de recurso pela
manifestação pública por meio da imprensa, assume ela própria o risco de
agredir a honra do Magistrado, que julga com sua consciência obedecendo ao que
dispõe o direito positivo e a prova dos autos. A notícia da inconformidade
realizada pela imprensa não escapa do âmbito da responsabilidade civil, podendo
ser apenada civilmente se a matéria divulgada está em desconformidade com a
realidade dos fatos ou se ajunta a esses fatos avaliação que foge ao padrão
narrativo aceitável diante do princípio constitucional da liberdade de imprensa
ou, ainda, se ficar comprovado que houve o ânimo de atingir a honra do autor.
(...) Tal, como é evidente, não serve como paradigma para o chamado jornalismo
investigativo, hoje tão em moda, quando o órgão de imprensa se substitui aos
órgãos institucionalizados para apurar fatos ou denúncias por sua própria conta
e risco. Nesses casos, portanto, a responsabilidade há de ser apurada
considerando outros elementos que não estão agregados à jurisprudência sobre a
notícia de fatos efetivamente ocorridos, porquanto o veículo é que assume a
responsabilidade pela apuração e divulgação dos fatos, o que, sob todas a
luzes, não é o que está sendo julgado nestes autos. Aqui, o Tribunal local
considerou que o jornal não avançou sobre a narrativa dos fatos, o que
inviabiliza a procedência do pedido. Como já assinalou a Corte em diversas
oportunidades, tendo "constado do aresto que o jornal que publicou a
matéria ofensiva à honra da vítima abusou do direito de narrar os fatos, não há
como reexaminar a hipótese nesta instância, por envolver análise das provas,
vedada nos termos do enunciado n. 7 da súmula/STJ” (REsp nº 85.019/RJ, Relator
o Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 18/12/98; AgRgAg nº
612.157/RJ, da minha relatoria, DJ de 17/12/04; AgRgAg nº 397.103/SP, da minha
relatoria, DJ de 23/9/02; REsp nº 453.598/MT, Relator o Ministro Aldir
Passarinho Junior, DJ de 19/12/03). Assim, se as instâncias ordinárias
consideraram que as matérias publicadas estavam de acordo com os fatos
ocorridos, dentro, portanto, dos limites do direito de informação, avaliando a
prova dos autos, não há como impôr a indenização. Casos há, é certo, em que
mantida a base empírica do acórdão, pode e deve esta Corte decidir em outra
direção sem invadir a Súmula nº 7 (REsp nº 263.887/MS, da minha relatoria, DJ
de 7/5/01). Mas esse não é o caso dos autos.Não conheço do especial. (RE Nº 655.357 - SP (2004/0054517-2). RELATOR:
Min. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO).
Responsabilidade
civil. Notícia publicada em jornal. 1. Se a notícia guarda correspondência com a ocorrência,
como constatado no exame da prova feito nas instâncias ordinárias, não há falar
em dever de indenizar. 2. Recurso especial não conhecido. (...) Os embargos de declaração foram rejeitados. O
especial não pode prosperar. Pretende o autor combater o acórdão recorrido com
base em sua própria interpretação das notícias que foram veiculadas e que as
instâncias ordinárias não consideraram ofensivas ou distantes da realidade.
Esta Terceira Turma já decidiu não ser fato que enseja a indenização por dano
moral, se há correspondência entre o fato ocorrido e a notícia (REsp nº
263.887/MS, de minha relatoria, DJ de 07/5/01). Anote-se, neste feito, que o
acórdão recorrido examinou detalhadamente as notícias publicadas, concluindo
que não continham inverdades. A narrativa que começa com a substituição em
plantão para socorrer a filha enferma e continua com a investigação por conta
própria de ocorrência de que foi vítima, sem avisar as autoridades competentes
para tanto, provocou, até mesmo, reprimenda aplicada administrativamente, assim
como o indiciamento em inquérito concluído na Comarca de Águas Lindas – GO.
Vê-se, portanto, que não há como derrubar o exame da documentação constante dos
autos feito pelos Magistrados de primeiro e segundo graus de jurisdição. Eu não
conheço do especial. (RECURSO
ESPECIAL Nº 488.695 - DF (2002/0061124-2)RELATOR : MINISTRO CARLOS ALBERTO
MENEZES DIREITO).
Direito civil. Indenização por danos morais.
Publicação em jornal. Reprodução de cognome relatado em boletim de ocorrências.
Liberdade de imprensa. Violação do direito ao segredo da vida privada. Abuso de
direito.
- A simples
reprodução, por empresa jornalística, de informações constantes na denúncia
feita pelo Ministério Público ou no boletim policial de ocorrência consiste em
exercício do direito de informar.- Na espécie, contudo, a empresa jornalística,
ao reproduzir na manchete do jornal o cognome – "apelido" – do autor,
com manifesto proveito econômico, feriu o direito dele ao segredo da vida
privada, e atuou com abuso de direito, motivo pelo qual deve reparar os
conseqüentes danos morais. (RE Nº 613.374 - MG (2003/0217163-0) REL.:
MINISTRA NANCY ANDRIGHI).
Dano moral. Divulgação de discurso pronunciado na
Câmara Municipal.Dissídio. Precedentes da Corte.
1. Já decidiu
esta Terceira Turma que não justifica o pedido de indenização por dano moral a
simples divulgação de discurso pronunciado em sessão pública do órgão
legislativo municipal.
2. É preciso
ponderar as duas pontas da liberdade, aquela da preservação da dignidade da
pessoa humana e aquela da livre circulação da informação pela mídia. É essa
ponderação que eleva e protege o cidadão contra ataques a sua honra e, exempli
pare, assegura direito à informação. 3. Recurso especial conhecido e
provido (.RECURSO ESPECIAL Nº 403.639 - PR (2002/0002447-3) Rel. Min.
CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO).
1. Não é ato
delituoso a justificar a indenização por dano moral a notícia que informa a
prisão de funcionária pública por tráfico de entorpecente, se, efetivamente, o
auto de prisão em flagrante tem como base o art. 12 da Lei nº 6.368/76,
especificando tratar-se de tráfico. Em tal circunstância, o conhecimento do
especial não avança sobre a Súmula nº 07 da Corte porque a base empírica do
Acórdão recorrido é a de imputação falsa do crime de tráfico de entorpecente, o
que, como consta do auto, foi exatamente a imputação que ensejou a prisão da
autora. Não há, portanto, a imputação falsa, pela conformidade da notícia com o
crime atribuído pela autoridade policial.
2. Recurso especial
conhecido e provido. RECURSO ESPECIAL Nº 263.887 – MATO GROSSO DO SUL -
(2000/61074-7) - (11.705)REL. : MIN. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO.
Dano moral. Notícia em jornal com imputação falsa de
crime. Lei de Imprensa, art. 27, VI. Código Civil, art. 160.RECURSO ESPECIAL - RESPONSABILIDADE CIVIL – DANO MORAL -
LEI DE IMPRENSA - ACÓRDÃO - OMISSÃO - AFRONTA AO ART. 535 DO CPC - INOCORRÊNCIA
- ART. 49 DA LEI Nº 5.250/67 - DIREITO DE INFORMAÇÃO - ANIMUS NARRANDI -
EXCESSO NÃO CONFIGURADO - REEXAME DE PROVA - INADMISSIBILIDADE - SÚMULA 07/STJ
– DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL - AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA - RECURSO NÃO
CONHECIDO.
1.
Manifestando-se a Corte a quo, conquanto sucintamente, sobre a matéria
constante do dispositivo (art. 49 da Lei nº 2.520/67) cuja violação pretende-se
ver sanada mediante a interposição deste recurso, não restam configurados
quaisquer vícios no v. acórdão, consistente em omissão, contradição ou
obscuridade, pelo que se afasta a afronta
duzida ao art. 535 do CPC.
2. A
responsabilidade civil decorrente de abusos perpetrados por meio da imprensa
abrange a colisão de dois direitos fundamentais: a liberdade de informação e a
tutela dos direitos da personalidade (honra, imagem e vida privada). A
atividade jornalística deve ser livre para informar a sociedade.
Quanto ao valor pleiteado pelo Autor, a
título de indenização, por supostas ofensas à sua honra e à sua imagem,
impõe-se o devido questionamento em homenagem ao princípio da eventualidade. Os
bizarros cálculos que apresentou destoam dos ensinamentos doutrinários e
jurisprudenciais. Com o propósito de iludir o Juízo, faz afirmações mentirosas
com relação à situação econômica dos Réus. Na verdade, a situação econômica dos
Réus é difícil. O “Integração” apenas se mantém
33 anos em atividade em razão do ideal de seus proprietários e de seus
colaboradores, e da grande luta da imprensa do Interior, para manter a sua
sobrevivência. Haja vista que inúmeros
periódicos locais encerraram suas atividades nem bem passaram a funcionar.
A dificuldade de se administrar um jornal do Interior é, ao nosso ver, bem
maior do que administrar uma escola de música. Principalmente, depois de uma
administração exemplar de 24 anos, a cargo do maestro Antonio Carlos Neves
Campos. E esta dificuldade aumenta
quando instituições ligadas ao Governo do Estado, sem se preocupar com a
legislação que rege os processos licitatórios,
favorecem determinados jornais no
que tange à aplicação das verbas
destinadas às publicações, por razões que não vêm ao caso.
A empresa Integração - O Jornal do Povo Ltda. é inscrita no Simples Nacional, através da
Lei das Micro e Pequenas Empresas. Esta condição é em razão de seu faturamento
bruto mensal, com uma média de R$ 25 mil. Com este faturamento, a empresa paga encargos sociais, imposto federal do Simples,
impressão, distribuição e gastos gerais com combustível, energia elétrica,
água, luz, telefone etc. Além destas
despesas, o jornal possui uma folha de pagamento de empregados, sem se falar
dos respectivos, já bastante pesados.
O
Autor é que parece ter situação econômica privilegiada. Para se ter uma idéia de seu diferencial com a
situação do funcionalismo público estadual,
note-se que, no ano de 2008, com aprovação do Conselho da Associação de
Amigos do Conservatório de Tatuí, o salário de Diretor Administrativo passou de
R$ 7.000,00 (abril de 2008) para R$ 15.000,00. E, ao que parece, sem mostrar
nenhum serviço que justificasse esse aumento. Em março de 2009, a direção da
AACT aplicou um índice de reajuste de 6,5% a este salário, pelo que o Diretor
Executivo passou a receber R$ 16.700,00. Na verdade, é o Autor que desfruta de
situação econômica privilegiada a ponto de lhe permitir dispor de altos
recursos pelas demandas que promove,
inclusive contra professora do
Conservatório. Em uma breve comparação, de acordo com dados conhecidos, o Autor
ganha mais que o Secretário de Estado da Cultura (seu superior hierárquico),
mais que o Prefeito Municipal de Tatuí, mais que o Governador do Estado (que envia
todo dinheiro para manutenção do Conservatório) e seu salário, com carteira
assinada, é superior à do Presidente da
República.
Por outro lado, não tem cabimento pretender uma
indenização no importe de 40 salários
mínimos (R$ 18.600,00). Comparando com a decisão relativa ao processo
2005.001.157150-9, em que figura como Ré a Revista Época, de circulação
nacional, observe-se o valor que o juiz
Álvaro Henrique Teixeira de Almeida, ao
reconhecer um erro na reportagem “Bandidos de Classe Média”, publicada
na edição 384, de 26 de setembro de 2005, condenou a empresa Ré. A revista
publicou foto e nome de um administrador dizendo que ele foi preso com 10 mil
comprimidos de ectasy, quando voltava da
Holanda. Segundo o texto, ele foi o protagonista da maior apreensão desse tipo
de drogas no país. O magistrado condenou a revista a pagar R$ 22,8 mil de
indenização por danos morais para um administrador de empresas. Verifica-se, comparando-se este com o caso
destes autos, o despropósito do pedido de indenização feito pelo Autor, tendo em vista a fragilidade econômica do
Jornal Integração, o qual tem uma tiragem que não passa de 6 mil exemplares,
circulando numa pequena região, conforme se comprova pelos faturamentos mensais
(DOC.5).
Isto posto, espera-se que esta ação seja julgada
improcedente. Pede-se mais, que o Autor
seja considerado litigante de má-fé, com as conseqüências legais, por
abusar do direito de petição, atirando-se
numa verdadeira aventura
judiciária. Para tanto,
distorceu fatos, tirou expressões do
contexto, e suprimiu, espertamente, de
frase publicada, sinal gráfico decisivo, com o claro propósito de torná-la
ofensiva. Caso não seja este o entendimento de V. Exa., pede-se, alternativamente, que o
valor pleiteado não ultrapasse R$
1.000,00. Protesta por todas as provas em direito admitidas, especialmente pelo
depoimento pessoal do Autor.
N. T. P.
Deferimento.
Tatuí, 25 de
agosto de 2009.
P.p.______________________________________
José Rubens do
Amaral Lincoln